Celebramos neste domingo a Solenidade da Epifania do Senhor, a manifestação visível de Deus na pessoa de Jesus, que atrai a si todas as nações em busca de força para tornar o mundo mais humano e fraterno. Nos magos que buscam encontrar Jesus e, ao vê-lo, o adoraram, está a oferta da salvação a todos os povos. Aquele que veio para os seus, mas foi rejeitado por eles (Cf. Jo 1,11) recebe os que caminham ao seu encontro com sede de vida e experimentam uma alegria muito grande ao encontrá-lo.
O Evangelho de Mateus, proclamado na liturgia desta Solenidade, não descreve o nascimento de Jesus, como o evangelista Lucas, mas o constata e interpreta o significado oculto desse nascimento, vendo no menino nascido o Messias esperado. Mateus não tem a intenção de fazer uma reportagem jornalística narrando a visita de alguns estrangeiros à gruta de Belém, mas, com o recurso de símbolos e imagens expressivos para os cristãos primitivos, mostra Jesus como o enviado do Pai, que traz a salvação às pessoas do mundo inteiro[1]. O propósito do evangelista é apresentar uma catequese sobre a pessoa de Jesus e sua missão.
Após constatar o nascimento de Jesus em Belém, no tempo do rei Herodes, Mateus afirma que alguns magos chegaram a Jerusalém buscando saber onde estaria o rei dos judeus que acabara de nascer (vv. 2-3). O texto não diz quantos eram, nem que eram reis; menciona que eram alguns magos. A palavra magos poderia designar astrólogos babilônios, que provavelmente entraram em contato com o messianismo judaico. Nada indica que fossem reis (Cf. TEB, Novo Testamento, Mt 2,1, nota o). O primeiro a mencionar três magos foi Orígenes (Sec. III), número sugerido pelos tipos de presentes oferecidos: ouro, que significa a realeza de Jesus e o reconhecimento da dignidade e do valor inestimável do ser humano; incenso, que significa a sua divindade e o chamado ao ser humano a participar da vida divina; e mirra, que significa a sua humanidade que sofrerá, e o convite a cuidar, a consolar as pessoas que sofrem e nunca usar de violência contra o ser humano.
Os magos desconhecem as Escrituras Sagradas de Israel, mas são sensíveis ao brilho da luz. Atraídos por uma estrela, dirigem-se para adorar o menino que acaba de nascer (V. 2), em cumprimento da profecia de Isaías: “O povo que andava nas trevas viu uma grande luz. Sobre os que habitavam numa terra de sombras, brilhou uma luz diante dos seus olhos” (Is 9,1). Na missa do dia de Natal, João afirmava que Jesus, a Palavra divina, era a luz de verdade que veio ao mundo iluminar todo ser humano. Mas os seus não a acolheram (Cf. Jo 1,10-11). Conforme o teólogo José Tolentino, “a fé é uma grande escola do olhar” (Mística do Instante, p. 140). Contudo, o essencial, conforme Exupéry, não é visto pelos olhos, mas pelo coração. Os magos elevam os olhos para o alto, deixam-se conduzir pela luz que de lá emana. São conduzidos pela estrela até encontrar a luz verdadeira, onde se detêm em adoração. Aquele que não encontrou abrigo para nascer entre os seus, que foi rejeitado por muitos do seu povo, atrai outros povos ao seu amor e conta com a adoração e a generosidade deles.
Os magos se dirigem a Jerusalém, buscam informações no centro do poder político sobre o rei que acaba de nascer. Na resposta dada a Herodes pelos especialistas da Lei e pela hierarquia sacerdotal, está a comprovação do cumprimento da profecia de Miquéias: “Em Belém da Judeia deve nascer o Messias” (Mq. 5,1-3). Esses especialistas, diferente dos magos, conhecem as Escrituras Sagradas, mas não se interessam pelo menino, não têm disposição para caminhar ao seu encontro e adorá-lo. No menino nascido em Belém a esperança dos pobres se realiza. A salvação é oferecida a todos os povos. Ela não vem do centro do poder, Jerusalém, mas da periferia, do meio dos pobres, do pequeno Jesus. Os magos não o encontrarão no palácio de Herodes, mas na manjedoura, desprovido de majestade e revestido pela beleza da simplicidade, onde Deus se mostra. Ao colocar o rei Herodes em contato com Jesus, Mateus prenuncia o conflito que ocorrerá entre as autoridades oficiais e o verdadeiro rei e salvador do seu povo (Cf. nota n, TEB, N. T. p. 32 e 33). A salvação não virá pela ação violenta do tirano Herodes, nem pela falsa religião vivida pelos serviçais daquele malvado, mas do pequeno menino nascido na periferia.
Os magos contemplam a beleza do presépio desprovidos de razão para crer que ali estava o Messias esperado. Certamente ficaram comovidos ao lado da criança especial. “Não existe nada mais comovente do que uma criança adormecida. Quem contempla uma criança adormecida tem de ficar bom, tem de ficar manso. Uma criança adormecida não pede festas: pede silêncio e tranquilidade” (Rubem Alves, Sete vezes Rubem, p. 335). O papa Francisco interroga: “Por que motivo suscita o Presépio tanto enlevo e nos comove? Antes de mais nada, porque manifesta a ternura de Deus. Ele, o Criador do universo, abaixa-Se até à nossa pequenez. O dom da vida, sempre misterioso para nós, fascina-nos ainda mais ao vermos que Aquele que nasceu de Maria é a fonte e o sustento de toda a vida. Em Jesus, o Pai deu-nos um irmão, que vem procurar-nos quando estamos desorientados e perdemos o rumo, e um amigo fiel, que está sempre ao nosso lado; deu-nos o seu Filho, que nos perdoa e levanta do pecado” (Carta Apostólica sobre o presépio, n. 3).
Na Solenidade da Epifania celebramos a bondade de Deus que deseja salvar a todos. Mas faz-se necessário abrir-se ao amor oferecido, perceber onde a salvação é oferecida, não se deixar enganar por certas promessas propagadas. Não se iludir com os apelos dos “Herodes” de hoje, que desejam matar os que trazem esperança de vida. Como os magos, somos convidados a encontrar Jesus, adorá-lo e retornar por outro caminho. Sonhar um caminho novo para a nossa vida e para a vida da humanidade. Ao longo deste novo ano, caminhemos com esperança e nos empenhemos na construção de um mundo melhor.
[1]https://www.dehonianos.org/portal/solenidade-da-epifania-do-senhor-ano-a0/ (Consultada dia 20/12/2022).