No Evangelho deste domingo, Jesus continua sua caminhada rumo a Jerusalém, entra na cidade de Jericó, faltando apenas 34 km para chegar ao seu destino, na última etapa da sua peregrinação. Jericó era uma cidade desenvolvida, com grandes e belos jardins e palácios. Possuía um comércio próspero, com muitas oportunidades, mas também com muita desonestidade. A palavra Jericó significa perfumado, contudo, lá não havia um cheiro bom, mas um cheiro de fraudes. A cena descrita por Lucas no Evangelho deste domingo destaca um dos personagens desonestos da cidade: Zaqueu, chefe dos cobradores de impostos. O encontro dele com Jesus é um dos pontos altos da caminhada a Jerusalém.
Os cobradores de impostos eram relacionados entre as profissões desprezíveis de Jerusalém no tempo de Jesus, conforme o teólogo alemão Joachim Jeremias (Jerusalém no tempo de Jesus, p. 404). Eles, considerados publicanos, normalmente estavam associados a ladrões, prostitutas, pagãos, assassinos. Geralmente eram rotulados de pecadores (Cf. Mt 18,17; 21,31-32; Lc 18,11; 19,7). Os romanos, de quem os chefes dos cobradores de impostos estavam a serviço, estabeleciam um valor fixo que os chefes dos cobradores de impostos deveriam pagar ao Estado e eles extorquiam os pobres o máximo que podiam utilizando o aparato policial a serviço dos seus subordinados para a tarefa. Quanto mais impostos arrancavam dos pobres, mais aumentavam seu patrimônio. Restava ao povo pagar para não ser agredido. As pessoas nutriam um ódio mortal por eles, manifestado nas palavras que lhes referiam. Zaqueu é muito malvisto pelos judeus, além de ser colaboracionista dos dominadores romanos. É considerado uma pessoa sem salvação.
O evangelista Lucas narra que quando Jesus atravessava a cidade, Zaqueu, nome que significa justo, mas na realidade era injusto, procurava vê-lo. O desejo de ver Jesus é mais do que uma curiosidade, era uma busca intensa para o sentido da sua vida, para a sede de felicidade que o dinheiro não tinha oferecido. Lucas o descreve pelo que tem: era muito rico; e pelo que faz: era chefe dos cobradores de impostos. Também descreve que era muito baixo, talvez para dizer que mais do que de pequena estatura, o era moralmente. A cena é hilária: um homem rico correndo à frente da multidão e subindo numa árvore para ver Jesus. Mas aquele que queria ver Jesus é visto por Ele, pois Deus não ignora aqueles que possuem o sincero desejo de encontrá-lo. Jesus não se contenta em ser visto e em vê-lo, quer muito mais: quer ser encontrado, quer entrar na casa dele, na vida dele e transformar a sua história. É muito curioso esse olhar de Jesus e difícil de ser entendido: o que viu naquele pecador desonesto para querer entrar na sua casa e lhe oferecer a salvação? Viu uma porta aberta não somente para hospedar-se, mas para uma real mudança de vida do seu anfitrião.
Lucas diz que Jesus olhou para cima e convidou Zaqueu a descer depressa. Narra ainda que Jesus se convidou a ir hospedar-se na casa de Zaqueu, que desceu depressa e o recebeu em sua casa com alegria. No Evangelho de Lucas, além dessa vez, somente outras duas vezes fala-se de pressa: Maria que vai com pressa ao encontro de Izabel (1,39) e os pastores que vão depressa ao encontro do menino Jesus em Belém (2,16). Jesus tem pressa para entrar na vida de Zaqueu e lhe oferecer a salvação. Tem pressa que ele experimente a alegria da verdadeira vida.
A atitude de Jesus provoca murmúrio e desaprovação daqueles que se julgavam puros, gente do bem, que não admitiam o contato com um pecador público. Mas Jesus afirma que “veio procurar e salvar o que estava perdido” (v. 10).
No capítulo anterior, ao falar do homem rico que deseja saber de Jesus o que fazer para entrar na vida eterna e que é convidado a ser generoso com os pobres, Lucas destaca a resposta negativa daquele homem e a afirmação feita por Jesus do quão difícil é um rico entrar no reino de Deus (18,24-25). A conversão, para um rico, exige novo estilo de vida, novo jeito de se relacionar com os bens. O que faltou àquele homem chamado por Jesus, que se julgava fiel cumpridor dos mandamentos da lei de Deus, sobrou no pecador Zaqueu. Ele muda completamente a sua relação com os bens. Seu coração torna-se sensível às necessidades dos mais pobres. A sua mudança foi radical: dá a metade dos seus bens aos pobres e, aos que defraudou, devolverá quatro vezes a mais. A lei dos judeus prescrevia somente a devolução em dobro (Cf. Ex 22,3). O encontro com Jesus o torna livre das riquezas que o aprisionavam, converte o seu coração e o torna rico do Reino de Deus.
Ao afirmar: “Hoje a salvação entrou nesta casa” (V. 9), Lucas recorda o programa de vida de Jesus na sinagoga em Nazaré, anunciando a Boa Notícia aos pobres. Ele conclui aquele discurso dizendo: “Hoje se cumpriu essa passagem da Escritura que vocês acabaram de ouvir” (Lc 4, 21). Esse hoje ocorre no agora. O hoje de Deus nunca passa.
No Evangelho deste 31º domingo do Tempo Comum, Lucas apresenta seus temas mais apreciados: a conversão dos pecadores, mesmo de um rico, que dificilmente entra no Reino de Deus; a solidariedade de Jesus com as pessoas que pecam e a alegria da salvação oferecida a todos. O texto renova a nossa esperança. “O Filho do Homem veio procurar e salvar o que estava perdido! ” (v. 10). Não há caso impossível para Deus!
+Dom Jeová Elias
Bispo Diocesano